quinta-feira, 30 de junho de 2016

lavenere84981
“Criminalizam-se os movimentos populares pela ligação do Judiciário com as elites econômicas”
Para Marcelo Lavenère: o Poder Judiciário no Brasil ainda reflete as origens de um Brasil patrimonialista e submetido às oligarquias locais.
Em entrevista ao MST, o advogado autor do pedido de impeachment de Fernando Collor, em 1992, e apoiador da ação dos movimentos populares, Marcelo Lavenère, analisa como o Poder Judiciário atua progressivamente, articulado com outros setores, na criminalização dos movimentos e dos defensores de direitos humanos.
Para ele a recente prisão de militantes do MST de Goiás, sob argumento de pertencimento à organização criminosa, é “absurda e inaceitável” e revela a intensificação do Estado Penal brasileiro contra aqueles que ousam atentar contra o patrão, o chefe, o proprietário.
Como o Poder Judiciário criminaliza a ação dos movimentos populares e de defensores de direitos humanos?
Lamentavelmente o Poder Judiciário no Brasil ainda reflete as origens de um Brasil patrimonialista e submetido às oligarquias locais. O juiz, na sua Comarca, no seu gabinete, lá no município no interior do país reconhece a força e poder político do prefeito, do deputado da região, do latifundiário que predomina na área, do empresário que tem indústria na região e imagina que a estes ele deva render homenagem.
Por essa ligação do Poder Judiciário – do juiz e do promotor de justiça, junto com a polícia civil, militar, federal, delegados – esse complexo de repressão nos estados tem, historicamente, uma dependência e reverência às estruturas e elites políticas e econômicas que atuam na região.
Por força disso, qualquer movimento popular, especialmente de trabalhadores rurais sem-terra, é visto como agressão à propriedade e, como a propriedade está ligada umbilicalmente à essa estrutura repressora e elitista, qualquer forma de atentado e crítica à propriedade, ao empregador, ao patrão é vista como uma atitude ilícita, de delinquente e que tem que ser reprimida. Portanto, criminalizam-se estes movimentos por força da ligação do Poder Judiciário, na sua base, com estas estruturas das elites, econômicas e repressoras.
Por força deste compromisso histórico, cultural e ideológico das bases do Poder Judiciário com o latifúndio, com o coronelismo, as decisões da 1ª Instância terminam por influenciar na 2ª Instância, nos Tribunais Regionais Federais, especialmente nos Tribunais de Justiça em que se encontra uma mentalidade praticamente igual ao da 1ª Instância.
Os desembargadores dos diversos Tribunais de Justiça, por exemplo os de Goiás, Maranhão, Bahia, locais em que há um conflito maior com movimentos, estes Tribunais refletem uma mesma posição, o de criminalização dos movimentos populares, de decidir sempre contra o camponês, o agricultor, o militante dos movimentos populares.
Vimos a situação de Goiás como inédita e inaceitável, que o Poder Judiciário do Goiás, tanto da 1ª Instância como o Tribunal de Justiça, criminalizar a tal ponto o MST que o considerar como organização criminosa, enquadrando o Movimento dentro de uma lei destinada à repressão ao narcotráfico, ao primeiro comando da capital, terrorismo, e não um movimento social, de reivindicação política, de direito que está assegurado na Constituição Federal.
Esse exemplo inédito, absolutamente absurdo e inaceitável, mostra o Poder Judiciário na atuação para a repressão e criminalização dos movimentos. A fiscalização dos militantes, o monitoramento pelos órgãos de inteligência como ocorreu com o Valdir*, no estado de Goiás e que foi localizado no Rio Grande do Sul, mostra que os movimentos sociais estão na mira da inteligência da polícia civil e militar.
[*O agricultor Luiz Batista Borges e o militante pela Reforma Agrária José Valdir Misnerovicz foram presos nos dias 14 de abril e 31 de maio, respectivamente. Em ação articulada entre Poder Judiciário de Goiás, Secretaria Estadual de Segurança, setores econômicos locais e polícia militar, com base na Lei 12.850/2013, sustentam o encarceramento dos militantes sob argumento de integrarem uma organização criminosa].
Como que as diversas instâncias que compõem o Sistema Judiciário – Ministério Público, Poder Judiciário, polícia – atuam coordenadamente em favor da criminalização dos movimentos populares?
Quem está na ponta da repressão dos movimentos populares é a polícia, que executa as ações de repressão. Essas ações não são feitas pelo Ministério Público ou Judiciário.
É a polícia que invade os acampamentos dos agricultores militantes, quem planta armas nas mãos dos trabalhadores rurais, quem acusa o agricultor de cometer roubo por furto de equipamentos, quem identifica nos movimentos de ocupação das terras destinadas à Reforma Agrária como sendo de atividade de cárcere privado quando um jagunço de um latifúndio destes não tem acesso a plantação dos camponeses. A destruição de lavouras é um recurso muito comum pela polícia e pelos próprios proprietários, e atribuído aos trabalhadores rurais.
Outra forma de repressão pela polícia é assassinar um trabalhador e dizer que foram mortos porque reagiram. Isto aconteceu de forma muito clara no Paraná quando assassinaram Teixeirinha [Dirigente do MST, Bento da Silva, o Teixeirinha, foi torturado e morto por policiais, na ocupação realizada pelo Movimento na Fazenda Santana em Campo Bonito, região oeste do Paraná, no dia 08 de março de 1993].
Ele se entregou para salvar alguns companheiros e foi sacrificado. Os bandidos que o mataram fizeram um filme e levaram para o governo do estado afirmando que Teixeirinha tinha sido morto num tiroteio provocado por ele. Todas essas são maneiras ilícitas pelas quais a polícia agride, ataca os movimentos populares.
Ao Ministério Público compete a ação penal. Com extrema facilidade age rapidamente contra os militantes que são presos pela polícia, não com mesma rapidez que age contra os criminosos do colarinho branco; e providencia denúncias.
O MP encontra no Código Penal e na legislação repressora uma quantidade enorme de artigos em que capitula, por exemplo, quem faz um comício ou de quem ocupa uma terra destinada à reforma agrária, e na denúncia consta que as pessoas praticaram esbulho possessório, cárcere privado, porte ilegal de armas. Muitas vezes um facão, uma enxada é considerada “arma branca” para efeito da denúncia. Muitas vezes plantam arma de fogo no local do conflito como se fossem dos trabalhadores rurais.
Agora o Ministério Público está se juntando com o Poder Judiciário, com magistrados, juízes para, todos juntos, considerar o MST e qualquer outro movimento como sendo uma organização criminosa.
O Poder Judiciário não fica longe do que faz a polícia e o Ministério Público porque, com uma atitude extremamente repressora, recebe estas denúncias e se torna desinteressado e imunes qualquer tentativa em mostrar que os argumentos de crime não procedem.
Um exemplo é habeas corpus proposto pelos advogados dos movimentos populares que são desaprovados sem fundamentação necessária. Somente quando o processo chega ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ) a situação tem uma atitude mais isenta em relação aos movimentos populares.
Não é isenção completa porque a pressão do Poder Judiciário sobre o STJ é grande, mas como o STJ está afastado do quadro geral de operações e dos conflitos que se dão na área rural podemos dizer que ainda tem uma atitude mais isenta. Todavia, como a legislação tem se tornado cada vez repressora e tem dados mais instrumentos de uma mão pesada, então no STJ a dificuldade também é muito grande para se fazer a prova e demonstração de que estamos diante de atuações políticas e de movimentos sociais de reivindicação e não de movimentos que devam ser reprimidos pela polícia.
Como a aprovação de leis como a do Antiterrorismo (13.260/2013) e de definição da organização criminosa (12.850/2013) oferece ricos à ação dos movimentos populares e na luta pela efetivação de direitos?
O endurecimento da legislação que assistimos, estas que mencionamos [Lei Antiterrorismo e de Organização Criminosa] e outras que estão no mesmo quadro, como a tentativa de redução da maioridade penal e a decisão do STF que manda executar sentenças antes que elas terminem o seu ciclo judiciário – todo esse quadro de endurecimento legislativo é extremamente preocupante e censurável.
Esse endurecimento, esse aparato está na contramão do moderno direito penal que hoje visa mais a recuperação, a aplicação de penas que não seja apenas a restrição de liberdade, tem visão mais aberta dos movimentos sociais e não uma visão policial. Essa era uma visão do direito penal em todo o mundo até o endurecimento do terrorismo, no 11 de setembro de 2001, nos EUA – no mundo inteiro houve um retrocesso das convicções do Direito Penal.
O que não afetou o Brasil porque não somos um país que esteja sendo atacado por terrorismo. Pelo menos até agora, que começa o terrorismo de direita, mas não temos o terrorismo que se pratica no resto do mundo. Mas a tendência do direito era o ser mais garantista e flexível e substituir as penas de restrição de liberdade por penas alternativas.
Vemos que com a edição destes instrumentos normativos mais recentes no Brasil tomamos o mesmo bonde equivocado de criminalização. Mesmo que haja divergência com a ação dos movimentos populares, é preciso o espaço da divergência e não o do tratamento como criminosos, delinquentes, como se fossem pessoas fora da lei.
Como o Poder Judiciário reverte, na opinião pública, o local dos movimentos populares – de defesa de direitos para ameaça à democracia e à manutenção da ordem?
A atitude do Judiciário se reveste de apoio muito grande da grande mídia que faz tabula rasa da condenação do bandido, fazendo eco a uma atitude de repressão em que chegam a dizer que bandido bom é bandido morto.
Essa cultura de repressão encontra eco nos retratos da mídia comercial – a de considerar que os movimentos de trabalhadores que ocupam propriedades destinadas à reforma agrária, fazem greves e contestam a ordem vigente, o latifúndio, o coronel, as elites que muitas vezes são as maiores violadoras de direitos. Então o Poder Judiciário no Brasil encontra respaldo em suas decisões, já que tem demonstrado uma extrema permeabilidade à opinião publicada, à opinião majoritária, imposta pelo setor dominante. No entanto, o Poder Judiciário deveria ser contramajoritario, deveria atuar para que os direitos das minorias sejam efetivados.
O que vemos é que as decisões do Judiciário são, com apoio da mídia, geralmente bem recebidas, e muitas vezes até com comentários de que as medidas aplicadas são leves demais porque o que se pretende é colocar na cadeia e num regime de encarceramento desumano todos aqueles que são acusados de atentar contra estes ícones do sistema capitalista burguês – a propriedade privada, a rural, finalmente a autoridade que é alguém que é inquestionável.
Assim, o Judiciário se sente muito confortado pela repercussão de suas decisões.
Este estado de conforto tem relação com a articulação entre poderes e setores. Como o Poder Judiciário, para manutenção deste estado patrimonialista, conservador, concentrado, estabelece relações com poderes Executivo, Legislativo e setores empresarial e da mídia privada?
Todos estes setores no nosso país, infelizmente, estão ligados às elites econômicas. Nos estados, 80 a 90% dos deputados estaduais são ligados ao setor rural, ou à agroindústria. Um exemplo é Alagoas, os deputados são ligados à agroindústria do açúcar. No sul da Bahia, ligados à antiga produção de cacau. O recrutamento dos juízes, dos deputados, do poder executivo – prefeitos, governadores – é feito nesta área. São todos oriundos destas categorias dominantes da sociedade brasileira.
O Brasil é país extremamente desigual, ocupa o 80° lugar no mundo em desigualdade, um por cento da população, os ricos, detém a maioria das riquezas de todo o país. Todo esse sistema de concentração econômica também se torna um sistema de concentração política, especialmente, como se sabe, que nosso modelo eleitoral só permite que se eleja quem tem muito dinheiro, quem recebe dinheiro de propina ou tem caixa dois.
Os candidatos populares têm uma dificuldade extrema para se eleger porque os poderes são compostos por pessoas oriundas da mesma fôrma – uma elite econômica, de uma economia muito concentrada e que é, portanto, extremamente comprometida com a visão direitista e repressora dos movimentos sociais.
Algumas análises estabelecem paralelo entre a intensificação da criminalização dos movimentos populares dos tempos atuais – com a aperfeiçoamento do Estado Penal acompanhado de aumento da violência mais bruta, como nos despejos ocorridos nos últimos meses e assassinatos a sem-terra e povos indígenas, – com o contexto repressor presente na ditadura militar. Esse paralelo faz sentido?
Temos resíduos muito fortes do período da ditadura em muitos destes meios de repressão. Especialmente nas polícias militares, ex-integrantes das Forças Armadas e setores da inteligência migraram para setores da polícia militar. No estado do Paraná, quando foi assassinado o Teixeirinha, havia um grande contingente na polícia de pessoas oriundas da ditadura, e que foram absolvidas dentro dos quadros da polícia.
É certo que hoje muitas pessoas não estão mais presentes, já que temos 40 anos da ditadura, mas a filosofia e cultura da ditadura continuaram, seja nas polícias, seja no Ministério Público, no Judiciário, de forma que podemos dizer que ainda pagamos o preço deste período autoritário.
O subversivo, fosse um militante estudantil, um defensor da reforma agrária, era censurado na ditadura da forma mais dura possível, a ponto de se dizer naquela época que, ao matar uma pessoa, falavam que não era uma pessoa morta, mas um comunista, retirando toda a condição de ser humano desta pessoa.
Claro que esta mentalidade não ficou totalmente afastada destes meios de repressão, e como cultura ainda se faz presente em alguns setores da sociedade brasileira que destilam hoje o autoritarismo não somente para esta área [de luta pela terra, contra as elites econômicas], mas também para comunidade LGBT, de cultos africanos, de ocupantes de prédios e edifícios na luta pelo teto. Direcionam sua cultura repressora e de intolerância não somente na área rural, mas está chegando ás áreas urbanas.
Diante da criminalização da luta por direitos, como os movimentos populares devem atuar frente a este contexto de um Judiciário de poder tão cristalizado?
No estado de Alagoas, a polícia tem um comitê plural formado por advogados populares, polícia e movimentos. Quando ocorre um conflito, uma ocupação, este comitê é chamado e antes mesmo de uma ação repressora ele funciona como canal de comunicação. Seria bom que esta experiência fosse replicada nos estados.
Os movimentos populares, através de setores de comunicação e de direitos humanos, por meio de organismos como a Ordem dos Advogados do Brasil, redes de advogados populares, juízes pela democracia, podem fazer um trabalho para diminuir a atitude extrema repressora e intolerante com os movimentos.
Outra frente importante é se nós tivermos uma pedagogia nas escolas, com a juventude, mostrando a importância dos movimentos populares para a sociedade. A luta dos movimentos é dura. Precisamos contar outras histórias sobre a atuação dos movimentos populares.

quarta-feira, 29 de junho de 2016

Por Jeferson Miola
O presidente usurpador Michel Temer tem a estranha prática de reunir nas noites de sábados e domingos com os personagens mais controvertidos – para não dizer de outra forma – da política nacional.
No 28 de maio de 2016, um sábado, Temer antecipou o regresso a Brasília para se reunir às pressas com o ex-Advogado-Geral da União do FHC e atual presidente do TSE, o tucano Gilmar Mendes.
Oficialmente, disseram ter tratado sobre verbas para as eleições municipais. É difícil aceitar esta versão, porque naqueles dias haviam sido divulgadas as conversas gravadas de um dos principais operadores de corrupção do PMDB, Sérgio Machado, com os mais notáveis figurões do Partido que ele presidiu nos últimos 14 anos.
O surpreendente, naquela ocasião, não foi a publicidade das conversas de Machado com Romero Jucá, Renan Calheiros e José Sarney, mas o ocultamento de outras conversas também havidas – e sobram razões para se suspeitar que as gravações de Temer, que tratou de propina com Sérgio Machado na Base Aérea de Brasília, foram [e continuam sendo até hoje] bem guardadas. O encontro do Temer com Gilmar [1] pode ser a chave para se entender esta circunstância, que foi decisiva para a continuidade do golpe de Estado.
Hoje se ficou conhecendo o encontro secreto do presidente usurpador com seu sócio no golpe, Eduardo Cunha, ocorrido na noite do domingo passado, 26 de junho.
Michel Temer diz que “_fala com regularidade_” com Cunha, o que é, em si mesmo, um tremendo absurdo e evidência de uma convivência duvidosa com um réu-criminoso que um presidente legítimo jamais
poderia manter e que, todavia, é assimilável para um presidente usurpador.
Temer alega que na noite do domingo passado conversou sobre a conjuntura política _[sic] _com este notável réu-criminoso que está com o mandato parlamentar suspenso.
Foi noticiado que eles conversaram sobre a sucessão na Câmara dos Deputados _[sic]_. É útil recordar que Cunha, além do mandato suspenso, está proibido inclusive de freqüentar a Casa, quanto mais
tratar de assuntos da gestão institucional.
O significado dessa proibição é análogo à proibição ao marido agressor se aproximar da ex-esposa: evitar que o criminoso continue perpetrando o crime. A despeito disso, Temer recebeu o réu-criminoso no
Palácio do Jaburu para tratar de assunto que aquele “bandido [2]”, como chama a imprensa internacional, está judicialmente proibido de tratar.
Fossem tempos diferentes, com uma imprensa honesta, um sistema político sério e respeitável, um sistema jurídico justo e isento, o golpe de Estado perpetrado através do _impeachment_ fraudulento da Presidente
Dilma jamais teria prosperado.
Como os tempos são outros, encontros suspeitos do presidente usurpador são apenas registros assépticos em espaços acanhados do noticiário feitos com atraso de dois dias.
E, assim, o golpe segue.

terça-feira, 28 de junho de 2016

O ofício do historiador e os formadores de quadrilha
por Silvia Hunold Lara, Historiadora, pela democracia
Nos últimos meses, um grupo de historiadores decidiu se manifestar publicamente em defesa da democracia.
Fazendo uso de meios de comunicação alternativos, criou nas redes sociais o grupo Historiadores pela Democracia, produziu vídeos e textos, além de um manifesto em defesa do governo legítimo que está sendo deposto por meio de um golpe.
Há ali gente de tendências diversas, tanto do ponto de vista político como profissional.
O que os une é a certeza de que o Legislativo e o Judiciário, com apoio dos grandes meios de comunicação, associaram-se para afastar do poder a presidente democraticamente eleita que, apesar da crise e de vários erros (incluindo relações ambíguas com a corrupção), vinha se mantendo na defesa de direitos básicos estabelecidos na Constituição.
Em 7 de junho, uma parte desse grupo foi ao Alvorada, prestar sua solidariedade a Dilma Rousseff, afastada da presidência sob a alegação de ter cometido “crimes de responsabilidade” que, aliás, também foram praticados por seus antecessores e por vários governadores e prefeitos.
O Legislativo fez uso de mecanismos constitucionais e o Judiciário estabeleceu o ritual do processo.
A aparente legalidade não esconde, entretanto o golpe articulado por forças retrógradas que se instalaram no poder e esforçam-se por dar uma guinada ultra liberal na economia, diminuir conquistas dos trabalhadores, limitar políticas sociais e restringir direitos humanos.
Os historiadores não foram os primeiros nem os únicos profissionais a se manifestar, nem a denunciar o golpe em curso.
Mas chamaram a atenção de dois dos principais jornais do sudeste brasileiro: um publicou um editorial agressivo contestando a qualidade profissional dos participantes do grupo (“O lugar de Dilma na história”O Estado de São Paulo, 14/06/16), e o outro um artigo, assinado por um de seus articulistas habituais, criminalizando o movimento (Demétrio Magnoli, “Formação de Quadrilha”, Folha de São Paulo, 25/06/16).
Ambos têm uma ideia bem tacanha do que seja o ofício do historiador.
O primeiro afirma que o papel da história é “o de reconstituir o passado para entender o que somos no presente”.
O segundo diz que “o historiador indaga o passado, formulando hipóteses que orientam a investigação e reconstrução da trama dos eventos”.
Pois aí está o problema: o papel do historiador nunca foi o de “reconstituir” o passado.
Analisando os documentos produzidos pelos diversos sujeitos que participam de um acontecimento ou fazem parte da sociedade, nós interpretamos o passado, procurando explicá-lo.
Essa explicação nunca é unívoca, posto que deve compreender as diversas forças que produziram os “fatos”.
Nem tampouco é singular: a história – como aprendem os alunos desde o primeiro ano do curso – não se escreve com verbos regulares e, geralmente, usa o plural.
Isso acontece com o passado histórico que, pela sua própria natureza, como o presente, é prenhe de tensões e vozes dissonantes.
O mesmo se dá com o trabalho dos historiadores, que só se realiza no diálogo com interpretações e explicações diversas.
Ao supor a unicidade da história e dos profissionais que denunciam o golpe, os dois jornalistas produzem um efeito de verdade muito útil para a defesa de suas posições.
O Estado de São Paulo acusa os Historiadores pela Democracia de serem “intelectuais a serviço de partidos que se dizem revolucionários”, registrando que todos aqueles profissionais estão a serviço do “lulopetismo”.
O articulista da Folha de São Paulo os coloca como militantes de um Partido totalitário.
O primeiro recorre a um neologismo depreciativo.
Ele faz par com outros, mais recentes, como “esquerdopata”, “petralha”, “feminazi”.
São substantivos coletivos que servem claramente para desqualificar todos os que não pensam como o emissor do discurso.
O uso varia conforme a ênfase que se queira dar: contra uma opção político-partidária, contra os que defendem princípios democráticos e/ou libertários ou os direitos das mulheres e de outras minorias.
Como se em cada um desses registros só coubesse uma forma única de ser e de pensar.
O tratamento coletivo e pejorativo serve, assim, a uma visão incapaz de abarcar a pluralidade.
O mesmo acontece quando se tenta explicar que a atitude desses historiadores estaria sendo conduzida por um Partido, com “P” maiúsculo.
Tal fantasmagoria só revela a completa ignorância do colunista em relação à diversidade de posições desses profissionais da área de História – alguns dos mais competentes e destacados, no Brasil e no exterior.
Além de associar dessemelhantes, o colunista da Folha acusa os Historiadores pela Democracia de possuírem “alinhamento ideológico” próximo ao “alinhamento corporativo” dos juízes do Paraná que tiveram seus salários divulgados em uma reportagem.
Como se trata de um atentado contra a liberdade de imprensa, ele analisa contradições entre a pretendida defesa dos valores democráticos por associações de magistrados e o assédio judicial cometido contra os jornalistas.
Aqui, o golpe e o “sequestro do sistema de justiça” podem ser denunciados.
Estranhamente, o articulista não associa os historiadores aos jornalistas, mas sim aos juízes, invertendo completamente a lógica mais elementar.
São os juízes que estão recorrendo a estratagemas e brechas do sistema legal para cassar, na prática (como diz o próprio Magnoli) os direitos dos jornalistas.
Se isso pode ser admitido nesse caso, por que não concordar com aqueles que denunciam que, “na prática”, o que se assiste é à produção lenta e gradual de um golpe contra a democracia?
Ao xingar, acusar e desqualificar, juntando desiguais sob o signo de comportamentos deploráveis, o colunista se aproxima – ele sim – mais dos juízes do que de seus colegas jornalistas.
O que, na manifestação dos Historiadores pela Democracia teria incomodado tanto os autores desses dois textos e seus patrões?
A pista está nos títulos.
O lugar que todos nós ocupamos na história não está nas mãos dos historiadores, nem terão esses profissionais uma só verdade sobre ela, como já expliquei.
Como são partidários de uma história unívoca e “verdadeira”, temem que a narrativa histórica não lhes faça “justiça”.
Historiadores do presente e do futuro certamente lerão os documentos produzidos ao longo desse processo e poderão mostrar, com base neles, as forças atuantes, seus protagonistas, os vencedores e vencidos, e aqueles que ficaram em cima do muro.
Todos nós temos um lugar – e aqueles que lutaram pela pluralidade e pela diversidade poderão estar juntos, mesmo sendo diferentes.
O nome disso é democracia.
Os que usam malabarismos retóricos para criminalizar os que não pensam como eles estão fora deste campo.
Ao imaginar uma quadrilha, usar neologismos pejorativos e maiúsculas generalistas, imputam ao outro unicidades que buscam apenas intimidar.
Certamente exageros e figuras de linguagem fazem parte da disputa de ideias e argumentos.
Mas nesses textos há mais que isso.
A história tem exemplos dolorosos desse tipo de comportamento – basta lembrar textos e atitudes de alguns jornalistas, militantes e intelectuais da Alemanha ou da Itália nos anos 1930.
O nome disso é fascismo.

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Gaspari põe açúcar em Golpes - 1964 e 2016

Geisel e Golbery são, enfim, santificados!




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publicado 27/06/2016
bessinha ditadura
Elio Gaspari desempenhou papel não desprezível na redação do catecismo que levou ao Golpe de 2016.

Seu historialismo e a ubíqua militância na Fel-lha e no Globo, o Farol dos Piratas do Golpe, lançou a pedra fundamental de 2016 ao fazer a revisão-branda do regime militar.

Como se sabe, Gaspari fez uma barganha faustiana: obteve exclusividade para ter acesso às confidências de Geisel, Golbery e o chefe do almoxarifado, major Heitor Aquino Ferreira, secretário deles.

E se comprometeu a escrever a mais doce biografia da "ditadura".

Mas, avisou que tortura, não!

Ele condenou a tortura e santificou  os torturadores.

Essa obra revisora chegou agora a seu epílogo, o quinto volume: “A Ditadura Acabada”, da editora Intrínseca, especialista em globais..

Se, nos quatro volumes anteriores, Geisel era o Sacerdote e Golbery, o Feiticeiro, agora, finalmente, os dois são santificados.

Geisel "ganhou todas", diz o autor.

Golbery previu tudo e comandou tudo.

Os dois fizeram a "ditadura" e acabaram com ela quando bem entenderam, para restaurar a Democracia.

Foram tão sabidos que resolveram encerrar o ciclo com um bestalhão da extrema-direita,  o General Figueiredo, devidamente espinafrado no livro.

O que interessa em 2016 é que essa versão ajudou a construir o cenário para derrubar Dilma: o Golpe tem seus defeitos, mas a alternativa é pior.

Temer tem seus defeitos, mas Dilma e o lula-petismo são piores, diz o colonista na Fel-lha e no Globo.

A "ditadura", enfim recuperada por Gaspari, foi melhor que o petebo-comunismo de Jango.

É o Tribunal de Nuremberg ao contrário: Hitler sai como Sacerdote e Golbery, o Feiticeiro - mas, o Holocausto, não!

(O Brasil é de uma indigência política tão profunda que conseguiu desmoralizar a expressão "ditadura" e o que poderia ser sua correção, a "comissão da ½ verdade".)

Gaspari retoma agora sua tese central: Geisel e Golbery salvaram a Democracia ao desbaratar uma conspirata do Ministro da Guerra Silvio Frota, outro bestalhão de extrema-direita.

Tratava-se de uma de muitas escaramuças dentro do regime militar para disputar a supremacia.

Mas, Gaspari dá à intentona frotista uma dimensão que não teve.

E faz parecer que Geisel e Golbery venceram Austerlitz e Borodino.

Assim como tentou justificar a ditadura com um Golpe do Jango que só Gaspari sabe onde se escondia.

(Como se sabe, Gaspari disse no Volume Um de sua fluvial obra que Jango caiu porque gostava de pernas – de coristas e de cavalos.)

Ele exagera a alternativa para justificar o Golpe – o de 1964 e o de 2016.

Gaspari dedica esse livro a Ibrahim Sued de que foi repórter - leia "Colunismo em estado sólido, líquido e gasoso".

Lula é um parvo, na acabada ditadura.

Mal se percebe no líder sindical um fiapo de inteligência.

Roberto Marinho merece três míseras irrelevantes linhas.

E como diz  aquele navegante do Conversa Afiada: falar da BrOi sem mencionar Daniel Dantas e a ditadura sem falar em Roberto Marinho ... só o Gaspari.

Heitor Aquino, inesperadamente, passa a ter um protagonismo na "revolução" de 1964 só comparável ao da Operação Brother  Sam.

O autor não conta que o general Kruel recebeu cinco malas de dólares para trair o compadre Jango.

O autor não explica que os democratas Golbery e Heitor, quando foram expulsos do Palácio do Planalto, militaram na bem-sucedida campanha presidencial de Paulo Maluf.

Tão sabidos quanto liberais.

O autor insiste em não citar René Dreifuss, autor de um clássico - "1964 - A Conquista do Estado" -,  que descreve como Golbery foi o Goebbels do catecismo ideológico para derrubar Jango.

Gaspari, o único amigo do José Serra, diz que ele se exilou no Chile, na Bolívia e nos Estados Unidos.

Mas, se recusa a explicar como Serra, casado com uma Allende, deixou o Estádio Nacional, onde Pinochet guardava os marcados para morrer,  e apareceu na Universidade de Cornell, nos Estados Unidos.

Gaspari passa açúcar nos Golpes.

Deve estar para escrever seu Volume VI - "2016 - O Golpe Salvador".

Em que Serra será o Sacerdote e ele, Gaspari, o Feiticeiro.

Em tempo: pena que o documentarista da “ditadura”, Amaral Neto, não esteja mais entre nós. Faria desse livro um “especial” para o horário nobre da Globo: “Acabou-se o que era doce!”

Em tempo2: esse Bessinha...

Paulo Henrique Amorim

sábado, 25 de junho de 2016

Do Jornalistas Livres

Sue Branford foi convidada a participar de um painel sobre Mídia, Percepção e a Consolidação da Democracia Brasileira na Brazil Forum, conferência de um dia para discutir temas ligados à atual crise política brasileira, e dividiu a mesa com Otávio Frias Filho, do grupo Folha e Silvia Salek, da BBC Brasil em Londres.
Em sua fala, Sue fez duras críticas à grande mídia do Brasil, citando a concentração de propriedade da mídia nas mãos de poucas famílias, todas bastante conservadoras, e a manipulação de notícias por esses veículos, seja por dar maior ênfase a algumas notícias, por omitir outras notícias e por editar e fazer coberturas de forma a distorcer a realidade.
Durante sua apresentação ela usou dados de um relatório do Repórteres Sem Fronteiras sobre a mídia no Brasil e citou outras organizações e analistas que estudam o tema. Ela também relatou fatos que ela lembra de quando esteve no Brasil, como a notória edição do debate entre os candidatos à presidência em 1989, Lula e Collor, na véspera da eleição, feito pela Rede Globo, mostrando os piores momentos de Lula e os melhores de Collor.
Ao terminar sua fala, quando foi bastante aplaudida, o mediador do debate concedeu direito de resposta a Otávio Frias, pois a Folha havia sido citada.
Otávio então partiu para um ataque pessoal contra a conceituada jornalista inglesa.
Ele a descreditou como jornalista dizendo que ela agia como a militância do PT e que sentia falta na mesa de alguém da militância do PSDB, papel que ele não poderia fazer pois vinha de uma escola de jornalismo onde o jornalista deve “ser crítico a todas as fontes de poder, cabe ao jornalista se desengajar, se distanciar, e adotar uma visão de crítica erga omnes” (em relação a todos).
Sue Branford já morou no Brasil em duas ocasiões, quando foi correspondente da BBC, do Guardian, do Financial Times e do Times, e foi analista da BBC para a América Latina durante dez anos. Atualmente é editora do Latin America Bureau (LAB), agência de notícias independente sobre a América Latina.
O Brazil Forum foi uma conferência de dois dias que aconteceu em 17 e 18 de junho e propunha um debate sobre a atual crise política do Brasil. O evento foi organizado por estudantes brasileiros de várias universidades britânicas e contou com a participação de dezenas de especialistas e acadêmicos de várias áreas, entre eles o ex-ministro Celso Amorim, o ministro do STF Luis Roberto Barroso e o procurador do MPF Deltan Dallagnol.
Mais informações sobre o evento podem ser encontradas no link http://brazilforum.co.uk/index.php/speakers/
O site oficial do LAB está em www.lab.org.br e sua página do facebook em https://www.facebook.com/latinamericabureau

sexta-feira, 24 de junho de 2016

Da Carta Maior
Dados econômicos mostram que a política econômica recessiva, de diminuição do tamanho do Estado, gera piora nas contas públicas e aumento do desemprego.
Tatiana Carlotti
Entre os dias 15 e 16 de junho, a Fundação Perseu Abramo (FPA) promoveu o seminário “O Brasil do Golpe: o Plano Temer sob análise”. Na pauta, o desmonte das políticas sociais, culturais e emancipatórias (leia mais aqui) e, evidentemente, o retrocesso neoliberal na economia.

A subordinação externa do país e a política econômica, imposta pelo governo golpista, foram debatidas por Arno Augustin (economista e ex-secretário do Tesouro Nacional), Gilmar Mauro (dirigente nacional do MST) e Giorgio Romano (Universidade Federal do ABC - UFABC).

Ao analisar a eficácia da política econômica, em curso, Augustin foi categórico: “todos os dados econômicos mostram que a política econômica recessiva, de diminuição do tamanho do Estado, gera piora nas contas públicas e aumento do desemprego. Ela não gera crescimento econômico”.

A saída é justamente o contrário, apontou, ao explicitar como os governos Lula e Dilma, entre 2003 e 2014, superaram as restrições ao crescimento econômico, a partir de “um Estado que atuou conscientemente” estimulando os investimentos no país a partir do financiamento, a baixo custo, pelos bancos públicos; de melhorias na infraestrutura; e da distribuição de renda, através das políticas sociais, criando um dinâmico mercado interno.

Neste período, destacou, o Tesouro Nacional emprestou quase R$ 500 bilhões ao BNDES. “Esses recursos foram jogados na economia sob a forma de financiamentos com baixo custo que fazem com que o país tenha – e teve - melhorias nos seus níveis de formação bruta de capital”. Essas medidas, explicou, “estavam criando um Brasil soberano”, capaz de “trabalhar com um crescimento de médio e longo prazo mesmo em situações de crises e difíceis”.

O golpe, porém, encerrou este processo.

“O que estamos vivendo é uma tentativa de recolocar o Brasil em condições de não crescimento, impossibilitando a retomada dos investimentos”.  Um exemplo é o impacto perverso nos investimentos da atual taxa de juros SELIC - a 14,25%.

Concessões e falsas ilusões

Augustin também criticou a política econômica adotada pelo governo Dilma em 2015. Em sua visão, após a eleição, as medidas adotadas na seara econômica “já prenunciavam algumas coisas que hoje estão bem mais avançadas e bem mais radicalizadas no governo Temer”.

Ponderando que a concessão se tratou de um recuo tático, “decorrente da pressão de setores empresariais e financeiros que estavam impondo um programa que ganhou a sua versão máxima depois do golpe”, o ex-secretário do Tesouro foi taxativo: “certas concessões têm responsabilidade grande no que aconteceu, mas, certamente, elas não justificam o golpe”.

Em sua avalição, agora é o momento de “propor à sociedade brasileira, com firmeza, o que faz o Brasil crescer a médio e a longo prazos”. E, sobretudo, aprender a não ter ilusões, como a de acreditar que “comportar-se segundo as regras da especulação financeira vai gerar algum resultado positivo. Não vai”.

Augustin destacou, ainda, dois aspectos que, embora não justifiquem, explicam a forte reação dos setores financeiros contra os governos petistas: a queda da SELIC que, em 2012, chegou a 7,25% (metade do valor atual); e a diminuição do espaço de investimentos das instituições financeiras privadas no país.

Em 2015, as instituições financeiras privadas respondiam por 66% do que era emprestado no país, já as públicas representavam 34%. Em 2014, ocorreu uma completa inversão: as públicas respondiam por 54% dos recursos emprestados, enquanto as privadas representavam 46%. “Essa mudança de comportamento fez com que as públicas ganhassem mercado significativamente”, explicou.

Em sua avalição, “um mercado financeiro perdendo espaço (prevalência do sistema financeiro público sobre o privado) e uma SELIC baixa mexeram, evidentemente, com a especulação financeira e o rentismo, tradicionalmente fortes no Brasil. Isso gerou uma reação muito forte que acabou no golpe”.

Ameaça Temer

Augustin também analisou algumas medidas econômicas anunciadas pelo governo interino – e ilegítimo – de Michel Temer. Entre as mais preocupantes, destacou o teto para os gastos públicos nas áreas da Saúde, Educação, Ciência e Tecnologia. “Uma política que, de forma alguma, constrói desenvolvimento em médio e longo prazos”, apontou.

Ao mencionar o gasto de R$ 500 bilhões do governo federal apenas com o pagamento de juros da dívida, dada à alta taxa de juros SELIC, ele destacou que esse montante, pago em juros, “é muito mais relevante do que o ganho que, eventualmente, se terá em termos fiscais com o teto dos gastos primários em Educação, Saúde, Ciência Tecnologia”.

Ele também destacou que boa parte das pessoas acredita que dinheiro gasto em juros é diferente do montante gasto em Educação, Saúde etc. “Não é. É dinheiro igual ao outro. Não há nenhuma diferença”.

Para que o golpe seja derrotado, avaliou, “é preciso mostrar à sociedade uma política econômica de crescimento que permita um Brasil com maior soberania como o país pode ter, deve ter e vinha tendo”.

“Agora é o momento de reagir à contraofensiva neoliberal, com a força que temos de mobilização e a força de um programa econômico e social que já demonstrou ser o melhor para o Brasil”, complementou.

Um político no comando do Itamaraty

Na sequência dos debates, Giorgio Romano, professor de relações internacionais na Universidade Federal do ABC (UFABC), analisou as mudanças na política externa brasileira, destacando a atuação de José Serra à frente da pasta de Relações Exteriores.

“Ele dá um sentido à política externa totalmente distorcido e limitado”, apontou Romano, citando uma série de medidas recentes que mostram, claramente, a intenção do tucano de transformar o Itamaraty em “um outro núcleo para fazer política econômica e se projetar”.

Entre elas, o deslocamento da APEX (agência que faz promoção da exportação, com forte presença no exterior) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) para o Itamaraty, ampliando consideravelmente a receita do órgão. E, também, a tentativa do novo ministro em ser, também, o secretário executivo da Câmara de Comércio Exterior (CAMEX) que passaria à área presidencial.

Romano também chamou a atenção para o discurso de posse do novo ministro: “superficial, com muito marketing e poucas propostas viáveis ou concretas”.  Desse discurso, destaca três pontos principais: o anúncio de mudanças em relação a algo que nunca existiu; a continuidade política do que já estava em curso, mas é apresentado como algo novo; e, efetivamente, o que há de novo.

Do primeiro ponto, Romano avaliou a notória obsessão do tucano em desconstruir a “política altiva e ativa de país” dos governos Lula e Dilma. Com forte apoio da imprensa, Serra vem construindo a ideia de que os governos petistas promoveram uma política externa “megalomaníaca” e “ideológica”, responsável pelo “isolamento do país”.

No cerne do discurso, o mote: “antes existiam preferências ideológicas na política externa brasileira; mas, agora, será trabalhada a ideia de Estado e Nação”. Curiosamente, analisa Romano, durante os governos Lula e Dilma, foram os diplomatas e não os políticos que estiveram no comando do Itamaraty. Agora, porém, “há um político, com intenção política, dizendo que vai defender uma política externa independente”.

Outro discurso disseminado, internamente inclusive, é o do esvaziamento do Itamaraty. Esquecem, afirma Romano, que durante os anos Lula houve “um forte aumento de vagas e concursos no Itamaraty” e que a “política externa ganhou um enorme peso político”. Exemplos não faltam: “a forma como o Brasil entrou nos BRICS, no G-20 e ganhou a votação para estar na frente da FAO e da OMC”.

Apropriação de acordos já firmados

Romano também destrinchou as “novas medidas” anunciadas pelo ministro Serra. “Esses acordos bilaterais, praticamente acordos e solicitações de investimentos, com o Chile, com o México, com a Colômbia e com o Peru foram assinados com o Governo Dilma”.

Outro exemplo citado foi a negociação entre o Mercosul e a União Europeia. “Essa era uma política do governo Lula. A oferta do Mercosul foi feita no dia anterior à votação que tirou a Dilma [ do poder]. O Brasil trabalhou esse acordo, que só não avançou pela insistência da União Europeia. Agora o Serra vai para Paris: ‘eu vou resolver a parada’. Dias depois, o Estadão publica uma citação dele dizendo que o obstáculo do acordo não foi o Mercosul, mas a União Europeia”.

Já em termos de “novidades” no Itamaraty, o professor de relações internacionais apontou o avanço do conservadorismo na política externa. Em sua avaliação, “passadas as eleições municipais, teremos um governo muito mais conservador, mais conservador do que o governo Fernando Henrique”.

A diferença, apontou, está na visão de mundo:

“Nós olhávamos para um mundo em transição, rumo a uma multipolaridade (diminuição da hegemonia dos Estados Unidos) que poderia dar um espaço maior ao Brasil, caso o país se articulasse aos países do Sul, para ter mais força de negociação com os países do Norte. Daí toda a lógica da UNILA, UNASUL, participação no G-20”.

“Não há dúvidas de que o atual governo é “muito mais simpático ao capital norte-americano”, concluiu.

Tempos de luta
Em sua análise, Gilmar Mauro, dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), levantou uma série de questões voltadas ao fortalecimento da resistência contra o golpe.

Entre elas, a necessidade de novas formas ofensivas para o enfrentamento da ordem do capital em escala planetária. “Não temos uma Internacional, atuante e ativa, neste momento que mais carecemos. E carecemos não só do ponto de vista ideológico, mas econômico corporativo concreto”, apontou.

Ao analisar o fim de um cenário no Brasil, “calcado na demanda internacional das commodities agrícolas, no investimento público direto na economia e na abertura de crédito geral à população”, ele apontou a quebra do pacto entre a classe trabalhadora e a elite brasileira. E lembrou: “não fomos nós que rompemos [o pacto]”.

Destacando que, ao longo deste período, “o capital privado não investiu na economia brasileira, disputando, sempre e cada vez mais, os ajustes na perspectiva de manter taxas de lucros altíssimas na ciranda financeira”, Gilmar Mauro questionou:

“É possível ainda pensar em aliança com setores da burguesia social? ”

“Se não tem mais nenhum setor interessado neste projeto, seria a classe trabalhadora que o assumiria? ”

“Qual tipo de programa político e de alianças precisamos? ”

Crítico à perspectiva de que todos devem ganhar, “os empresários ganham, os trabalhadores ganham”, afirmou: “no nosso modo de ver, a conta não fecha desse jeito. No capitalismo alguém sempre tem que perder”.

“Eles estão impondo a perda deles para cima de nós. Daí o ajuste, visando a maior fatia da mais valia social produzida pela classe trabalhadora e juros, dividendos de grandes investimentos. É por isso que é preciso discutir que tipo de projeto nós queremos”, complementou.

O preço da despolitização

Mauro também criticou a ideia disseminada, “principalmente no Governo Dilma”, do crescimento da classe média brasileira. De forma equivocada, sustentou, essa ideia despolitizou a sociedade brasileira. “Sob uma perspectiva da sociologia norte-americana, disseminaram um conceito que não leva em consideração a propriedade, mas o indivíduo e a possibilidade individual de ascensão social”.

Na realidade, explicou, “o que temos no Brasil e no mundo é um aumento da classe trabalhadora com diferenciações sociais imensas. Uma parte com alguns direitos e ganhos evidentemente elevados se comparada com a outra parte, uma grande maioria com dificuldade de se estabilizar e precarizada. Mas, todas as partes dentro do grande espectro da classe trabalhadora”.

Em sua avaliação, essa despolitização está custando um alto preço ao país: “o grande conjunto da classe trabalhadora assiste à luta política no Brasil como se estivesse vendo uma partida de tênis”. Ele também chamou a atenção para a necessidade da renovação das formas organizativas dos movimentos sociais, populares, sindicais e dos partidos políticos.

“O que nós produzimos é o que de melhor a gente tem. Mas, o que a gente tem ainda é insuficiente para enfrentar a luta de classes neste tempo histórico”, considerou, ao chamar a atenção para necessidade, urgente, “do aprofundamento político e de um balanço crítico”, capazes de criar as condições necessárias de enfrentamento ao longo do próximo período.

“Serão tempos muito difíceis”, avaliou.

quinta-feira, 23 de junho de 2016

Do Estadão
 
 
Hashtag #TemerBaixaOPreçoDoFeijão está na lista de assuntos mais comentados na rede social nesta quarta-feira; preço do alimento já subiu quase 40% neste ano
 
O presidente em exercício Michel Temer respondeu aos apelos dos internautas e anunciou, pela sua conta na rede social Twitter, que o governo liberou a importação de feijão de três países vizinhos do Mercosul: Argentina, Paraguai e Bolívia. Em sua postagem, Temer usou a hashtag #TemerBaixaOPreçoDoFeijão, que está entre os assuntos mais comentados desta quarta-­feira. O grão já acumula uma alta de quase 40% no preço em 2016, até maio, de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). 
 
E os valores continuam subindo: o IPCA­15, considerado uma prévia da inflação, mostrou uma alta de 16,38% no feijão-­carioca na passagem de maio para junho. A disparada dos preços, que se deve a problemas climáticos, já virou piada nas redes sociais (veja abaixo), com imagens que mostram o grão sendo transportado em carro­forte ou sendo comparado a produtos de luxo. Em 2013, o mesmo aconteceu com o tomate, que era o vilão da inflação à época. 
 
O pedido pela liberação da importação foi feita ao ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Blairo Maggi, que participou de reunião com Temer nesta manhã. Em entrevista ao Portal do Planalto, Maggi disse que também está sendo estudada a possibilidade de trazer o produto do México, após a assinatura de um acordo sanitário, e da China.
 
Outra medida que está sendo tomada, afirmou o ministro, é de negociar com grandes redes de supermercado para que busquem o produto onde há maior oferta.
 
“Tenho me envolvido nas negociações com os cerealistas, com os grandes supermercados, para que eles possam fugir do tradicional que se faz no Brasil, e ir diretamente à fonte onde tem esse produto e trazer. E à medida que o produto vai chegando no Brasil, nós temos certeza que o preço cederá à medida em que o mercado for abastecido”, disse Maggi ao Portal do Planalto.
 
Além do feijão, o arroz também está mais caro: a alta é de 4% neste ano. E como esse é o prato típico do brasileiro, os preços mais salgados pesam no orçamento, principalmente da população de baixa renda, já acuada pela recessão e pelo desemprego.
 
De acordo com a auditoria de varejo da GfK, cada família consome cerca de três quilos de feijão por mês. No varejo, o quilo chega a custar hoje até R$ 12, conta o presidente do Conselho Consultivo da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), Sussumu Honda.
 
Clima. O Paraná, que é o principal Estado produtor do feijão, teve quebra de 14% na primeira safra encerrada em março e de 21% na segunda safra, que acaba de ser colhida e que somou 318, 2 mil toneladas. Já a terceira safra está sendo plantada. Mas ela é menor em relação às demais e insuficiente para reverter a alta de preço.
 
Em entrevista ao Estado na semana passada, o engenheiro agrônomo Carlos Alberto Salvador, da Secretaria da Agricultura do Paraná, afirmou que, em maio, o preço médio recebido pelo produtor do Estado pela saca de 60 quilos do feijão em cores foi de R$ 228,21, mais que o dobro do registrado no mesmo mês do ano passado (R$ 106,82). 

terça-feira, 21 de junho de 2016

HABERMAS ASSINA MANIFESTO A FAVOR DA DEMOCRACIA
 
IN DEFENSE OF THE DEMOCRATIC RULE OF LAW IN BRAZIL
On the 31st of March 1964, a coup d’état installed a civil-military dictatorship in Brazil, inaugurating a dark 21-year period of suspension of civil and political guarantees. Today, 52 years after, the Brazilian people face once more a break of the democratic order. As a result of the acceptance by the Senate of an impeachment process based on accounting irregularities, Dilma Rousseff, who had been elected in 2014 for a mandate of 4 years, was forced, on the 12th of May 2016, to stand down as President of the Republic. Even though this removal is supposed to be temporary, lasting up to 180 days, period during which the senators should reconvene to evaluate the motives that have resulted in the impeachment process, it is unlikely that Dilma should return to office. 
Dilma Rousseff’s temporary removal from office is the culmination of a process characterised by unprecedented arbitrariness and polarisation in democratic Brazilian society, perceptible at least since her re-election in 2014. By attributing the recent corruption scandals exclusively to the Worker’s Party’s (PT) administrations (although they were the only ones who had the courage to investigate them through, even when investigations turned against their own) and by manipulating  public opinion against the supposed risks of a left-wing takeover of the country, the right-wing opposition to Dilma Rousseff’s government took advantage of the economic crisis that emerged after years of stability and growth and led a violent media campaign against it. It managed to aggregate against the Workers’ Party (PT) and Lula’s and Dilma’s governments large sections of business elites and conservative middles classes, as well as authoritarian sectors represented in Congress and in the Judiciary, evidently aiming the hammering down of the social rights secured by Dilma’s government and the deregulation of economy. Besides, once in power, they will probably decline to further investigate corruption as it is likely to involve their own people, as opposed to Dilma Rousseff, whose probity in the administration of public affairs is not doubted, as corruption charges are not part of the impeachment process.
The impeachment is a juridical tool of extremely restricted scope in Brazilian presidentialism. It is regulated by Art.85 of the Brazilian Constitution of 1988, and its use is restricted to cases involving serious offenses (crimes de responsabilidade, “responsibility crimes”) carried out by the President. As the accounting irregularities in the administration of public funds that Dilma Rousseff is accused of are not serious offenses in the sense prescribed by the Constitution, it is evident that this impeachment is not legitimately grounded. Furthermore, the whole process was full of questionable aspects, which contribute to add further illegitimacy to its results. Therefore, it is not an exaggeration to consider the present impeachment process against Dilma Rousseff a white coup, which will yield long-lasting consequences to the democratic Rule of Law in Brazil.
In the face of all this, we consider necessary to state our absolute repudiation of the illegitimate destitution of President Dilma Rousseff, and our strong support for the maintenance of the Rule of Law in Brazil.
 
  1. Albena Azmanova – University of Kent, Belgium
  2. Alessandro Ferrara – University of Rome Tor Vergata, Italy
  3. Alessandro Pinzani – UFSC, Brazil
  4. Alina Valjent – Witten/Herdecke University – Germany
  5. Allan Breedlove –Loyola University Chicago, USA
  6. Alois Blumentritt – University Wien, Austria
  7. Amy Allen – Pennsylvania State University  – USA
  8. Anahi Wiedenburg – London School of Economics, Argentina/UK
  9. André de Macedo Duarte – UFPR, Brazil
  10. André Medina Carone – UNIFESP, Brazil
  11. Andreas Niederberger – Universität Duisburg-Essen, Germany
  12. Anna Dißmann – Witten/Herdecke University – Germany
  13. Arthur Oliveira Bueno –University of Erfurt, Germany
  14. Asger Sorensen – Aarhus University, Denmark
  15. Axel Honneth – University of Frankfurt/Columbia University, Germany/USA
  16. Aysen Candas – Bogazici University, Istanbul, Turkey
  17. Barbara Fultner  – Denison University, USA
  18. Bernat Riutort Serra – University of Illes Ballears –Spain
  19. Brian Milstein – Goethe University Frankfurt, USA/Germany
  20. Carlos Costa Dantas – Universidade Federal de Pernambuco, Brazil
  21. Carlos Henrique Santana – TU Darmstadt, Germany
  22. Charles Taylor – Mc Gill University, Canada
  23. Christopher Zurn – University of Massachussetts/Boston, USA
  24. Cora McKeena – Trinity College, Ireland
  25. Cristina Sánchez – Autonomous University of Madrid, Spain
  26. Dan Swain – Czech University of Life Sciences, Czech Republic
  27. Daniele Santoro – CNR, National Research Council of Italy, Italy
  28. David Alvarez – University of Minho/Braga, Portugal
  29. David Rasmussen – Boston College, USA
  30. Debora Spini – Syracuse University in Florence, Italy
  31. Dónal O’Farrell – Trinity College Dublin, Ireland
  32. Elisabeth v. Thadden – University of Jena, Germany
  33. Felicia Herrschaft – Goethe University Frankfurt, Germany
  34. Filip Vostal – Czech Academy of Sciences, Czech Republic  
  35. Firica Stefan – University of Bucharest, Romania
  36. Francisco Naishtat – Universidad de Buenos Aires –Argentina
  37. François Calori – Université de Rennes 1, France
  38. Gesche Keding – Jena University, Germany
  39. Gisleine Aver – UFSC, Brazil
  40. Giulia Lasagni – Università de Parma, Italy
  41. Giuseppe Ballacci – University of Minho, Portugal
  42. Gorana Ognjenovich – University of Oslo, Norway
  43. Gustavo Leyva Martínez – Universidad Autónoma Metropolitana, México
  44. Hans-Herbert Kögler – University of North Florida, USA
  45. Hartmut Rosa – Jena University, Germany
  46. Heikki Ikäheimo – University of New South Wales, Australia
  47. Igor Shoikhedbrod – University of Toronto, Canada
  48. Isadora Henrichs – Trinity College Dublin, Ireland
  49. Italo Testa – Parma University, Italy
  50. Jazna Jozelic – University of Oslo, Norway
  51. João Honoreto – University  of Witten/Herdecke, Germany
  52. Joaquín Valdivielso-Navarro – Universitat Illes Balears, Spain
  53. Johan Söderberg – Göteborg University, Sweden
  54. Johanna Oksala – University of Helsinki, Finland
  55. Johannes Schulz – Frankfurt University, Germany
  56. John Lumsden – University of Essex, UK
  57. Jonathan Bowman – University of Arkansas, USA
  58. José Adauto de Souza Neto – Universidade Federal de Pernambuco, Brazil
  59. Julian Culp – University of Frankfurt, Germany
  60. Jürgen Habermas – J.W. Goethe Universität Frankfurt, Germany
  61. Karoline Rhein – Witten/Herdecke University – Germany
  62. Kendralyn Webber  –University of California Riverside, USA
  63. Lenny Moss – University of Exeter, UK
  64. Leonardo da Hora Pereira – Université Paris Ouest Nanterre La Défense, France
  65. Lorenz Mrones – University of Witten/Herdecke, Germany
  66. Luiz Gustavo de Cunha de Souza – Institut für Sozialforschung/Frankfurt –Germany
  67. Marco Solinas – Florence University, Italy
  68. Marek Hrubec – Czech Academy of Sciences, Czech Republic
  69. Maria Ines Bergoglio – Universidad nacional de Córdoba, Argentina
  70. María José Guerra – Universidad de Laguna –Spain
  71. María Pía Lara – Universidad Autónoma Metropolitana, Mexico
  72. Marjan Ivkovic – University of Belgrade, Serbia
  73. Mark Haugaard – University Galway – Ireland
  74. Marlon Urizar Natareno, Universidad Rafael Landívar, Guatemala
  75. Martin Javornicky – University of Galway, Ireland
  76. Martin Sauter – n/a –Ireland
  77. Martin Seel – J.W.Goethe Universität Frankfurt, Germany
  78. Masao Higarashi – Ritsumeikan University –Japan
  79. Matteo Bianchin – University of Milano, Italy
  80. Matthias Kettner – University of Witten/Herdecke, Germany
  81. Matthias Lutz-Bachmann – J.W. Goethe Universität Frankfurt, Germany
  82. Melis Menent – University of Sussex, UK
  83. Miriam Mesquita Sampaio de Madureira – Universidad Autónoma Metropolitana, México
  84. Mykhailo Minakov – Kiev-Mohyla Academy, Ukraine
  85. Nancy Fraser –New School for Social Research, USA
  86. Nancy Love –Appalachian State University, USA
  87. Natalia Frozel Barros –University of Paris 1, France
  88. Nathan Cogné – Trinity College Dublin, Ireland
  89. Nicola Patruno – Goethe University Frankfurt, Germany
  90. Niklas Angebauer – University of Essex, UK
  91. Odin Lysaker – Agder University, Norway
  92. Ojvind Larsen – Copenhagen Business School, Denmark
  93. Onni Hirvonen – University of Jyväskylä, Finland
  94. Pablo Gilabert – Concordia University, Canada
  95. Patrick O’Mahonny – University College Cork –Ireland
  96. Pedro Augusto Pinho – UES-RJ/UFRJ, Brazil
  97. Pedro Federici Araujo – PUC/RJ – Brasil
  98. Philipp Schink – J.W. Goethe Universität Frankfurt, Germany
  99. Philippe Sonnet – Université Catholique de Louvain, Belgium
  100. Pierre Schwarzer – Universität Witten/Herdecke, Germany
  101. Radu Neculau – University of Windsor, Canada
  102. Rahel Jaeggi – Humboldt University Berlin, Germany
  103. Rainer Forst – University of Frankfurt, Germany
  104. Richard Stahel – University of Constantin the Philosopher in Nitra, Slovak Republic
  105. Robert Fine – Warwick University, UK
  106. Roberta Ramos Marques – Universidade Federal de Pernambuco, Brazil
  107. Robin Celikates – University of Amsterdam, The Netherlands
  108. Rodrigo Cordero – Universidad Diego Portales –Chile
  109. Ronan Kaczyznski – Goethe University, Germany
  110. Rosie Worsdale – University of Essex, UK
  111. Ruy Fausto – USP/Université de Paris 8, Brazil/France
  112. Sandra Cruz – UNIFESP, Brazil
  113. Steven L. White – Wayne State University, USA
  114. Susan L. Foster – UCLA, USA
  115. Thomas Fossen – Leiden University, The Netherlands
  116. Valerio Fabbrizi – University of Rome, Tor Vergata, Italy
  117. Wolfgang Heuer – Freie Universität Berlin, Germany
  118. Yara Frateschi – UNICAMP, Brazil
  119. Zuzana Uhde – Czech Academy of Sciences, Czech Republic